Crédito Consignado: Estrutura, Regulamentação e Impactos para Trabalhadores e Empresas

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 O crédito consignado é hoje uma das modalidades de empréstimo mais faladas no Brasil. Conhecido por suas taxas de juros mais baixas e pelo baixo índice de inadimplência, ele tornou-se uma representatividade de um dos pilares do mercado de crédito nacional.

Porém, por trás dessa aparente simplicidade, há um sistema sofisticado, que envolve legislação trabalhista, previdenciária, normas do Banco Central, convênios empresariais, integração tecnológica com a folha de pagamento e, mais recentemente, o E-Consignado Trabalhador. Vamos falar mais um pouco sobre isso!

1. Base Legal do Crédito Consignado

As normativas legais que sustentam essa modalidade é amplo e merece nossa atenção:
Lei nº 10.820/2003 → autoriza o desconto em folha para trabalhadores celetistas e disciplina regras gerais.
  • Lei nº 8.112/1990 → abrange servidores públicos federais, que têm normas próprias.
  • Instruções Normativas do INSS → definem limites e operacionalizam o consignado para aposentados e pensionistas.
  • Resoluções do Conselho Nacional de Previdência Social (CNPS) → fixam tetos de juros, prazos máximos de contrato e margem consignável.
  • Banco Central do Brasil (BCB) → regula as operações, exigindo das instituições financeiras informações periódicas e observância de regras prudenciais.

Vamos pensar e entender que esse conjunto garante uma segurança jurídica ao credor e proteção mínima ao tomador, embora críticas apontem lacunas quanto ao risco de superendividamento, o que não podemos desprezar e ficar atentos pois, o risco existe.

2. Margem Consignável: Coração das Regras do Consignado

A margem consignável é o ponto central que sustenta toda a lógica do crédito consignado. Será através dela que se determina quanto da remuneração ou benefício pode ser comprometido com descontos em folha, funcionando como o mecanismo de equilíbrio entre proteção ao trabalhador e segurança para os bancos.

  • 35% da remuneração líquida.

Pontos importantes!
  • Para o trabalhador, a margem evita que todo o salário seja consumido por empréstimos.
  • Para o banco, é a garantia de que o valor emprestado será descontado de forma segura.
  • Para a empresa, é a referência obrigatória para realizar os descontos corretamente, sob pena de responsabilidade trabalhista.
Esse cálculo depende de rubricas específicas no ESocial (S-1200 e S-1210), que precisam estar parametrizadas com rigor técnico, já que alimentam diretamente o E-Consignado Trabalhador.

3. O E-Consignado do Trabalhador: a chegada de uma nova sistemática de crédito

E-Consignado Trabalhador é um sistema que trouxe uma nova forma na concessão de crédito para empregados do setor privado.

Características principais:
Centralização digital da margem consignável, acessível pelo trabalhador.
  • Integração automática com o ESocial, evitando divergências entre empresas e bancos.
  • Transparência: o empregado poderá visualizar em tempo real sua margem disponível e contratos ativos.
  • Segurança: reduz fraudes, já que elimina a manipulação manual de margens por parte da empresa ou terceiros.

Para o Departamento Pessoal, isso significa que erros na transmissão de eventos periódicos podem travar ou distorcer a margem consignável, tornando a precisão no ESocial ainda mais estratégica.

4. Impactos Econômicos

O consignado representa um dos maiores volumes de crédito pessoal no país. Segundo dados recentes do Banco Central, mais de R$ 500 bilhões já estão alocados nessa modalidade.

Vantagens econômicas:
Menor risco de inadimplência → juros reduzidos.
  • Expansão da oferta de crédito a trabalhadores de baixa renda.
  • Estabilidade para o sistema financeiro, já que a cobrança é automática.

Riscos econômicos:
Superendividamento indireto: embora a inadimplência atualmente seja baixa, muitos trabalhadores acabam com renda líquida insuficiente para suas despesas básicas e isso pode aumentar gradativamente.
  • Dependência excessiva: o consignado pode mascarar desequilíbrios financeiros estruturais e inviabilizar ainda mais a situação financeira do trabalhador.


5. Benefícios e Riscos para Trabalhadores e Empresas

Para trabalhadores:
Benefícios: acesso a crédito barato, prazos longos e previsibilidade.
  • Riscos: queda da renda disponível, uso indevido para consumo imediato em vez de investimento ou quitação de dívidas mais caras.

Para empresas:
Benefícios: retenção de talentos, clima organizacional mais saudável, redução de pedidos de adiantamento salarial.
  • Riscos: passivo trabalhista por descontos incorretos, dependência de sistemas (eSocial/E-Consignado) e impacto na reputação em caso de falhas.

6. Regras para o Cálculo da Margem Consignável

Regras Essenciais:

Remuneração disponível =
(+) Somatório das rubricas de vencimento que têm incidência de contribuição previdenciária (INSS);
(-) Descontos que tenham incidência previdenciária;
(-) O desconto da própria contribuição previdenciária do trabalhador (INSS);
(-) Retenção do I.R.R.F;
(-) Outros descontos compulsórios (por exemplo: pensão alimentícia).

  • Rubricas sem incidência de INSS (verbas indenizatórias – exemplo: reembolsos, ajudas de custo, indenizações não habituais) – quando corretamente caracterizadas como indenização não integram o somatório inicial então, não aumentam a remuneração disponível.
  • Descontos voluntários autorizados pelo empregado (exemplo: desconto de convênio facultativo, contribuições opcionais) – não são considerados na apuração da remuneração disponível, dessa forma não reduzem a base de cálculo da margem consignável.

Observação técnica: a margem legal aplicável é de 35% sobre a remuneração disponível para a maioria dos trabalhadores CLT (30% para empréstimos + 5% para cartão consignado dentro do limite total), e o cálculo deve seguir o registro das rubricas no ESocial (S-1200 / S-1210). 

Vamos a um exemplo prático?

Dados (exemplo hipotético — valores arredondados para facilitar a leitura):

Salário base (incidência INSS): R$ 4.000,00
  • Horas extras (incidência INSS): R$ 200,00
  • Comissão (incidência INSS): R$ 300,00
  • Ajuda de custo / reembolso (sem incidência INSS): R$ 150,00 ← excluído do somatório inicial

Descontos (do contracheque):
Desconto INSS (contribuição do trabalhador): R$ 450,00
  • IRRF retido: R$ 100,00
  • Desconto por faltas (rubrica de desconto com incidência previdenciária): R$ 150,00
  • Pensão alimentícia (desconto compulsório): R$ 200,00
  • Descontos voluntários autorizados (ex.: contribuição a plano facultativo): R$ 120,00 ← não são subtraídos na apuração da remuneração disponível

Cálculo:
Somatório das rubricas com incidência INSS:
 Proventos base = Salário base + Horas extras + Comissão
= R$ 4.000 + R$ 200 + R$ 300 = R$ 4.500,00

Subtrair (a) descontos com incidência previdenciária
Faltas - R$ 150
Desconto INSS do empregado - R$ 450
IRRF - R$ 100
Pensão alimentícia - R$ 200.
Total descontos obrigatórios =
R$ 150 + R$ 450 + R$ 100 + R$ 200 = R$ 900,00

  1. Remuneração disponível = 
R$ 4.500,00 − R$ 900,00 = R$ 3.600,00
(observe: a ajuda de custo R$150 e o desconto voluntário R$120 não foram subtraídos/considerados conforme regras acima)

Margem consignável (35%) = 35% × R$ 3.600,00 = R$ 1.260,00

Portanto, nesse mês o trabalhador pode comprometer até R$ 1.260,00 em parcelas de consignado (sendo que, dentro desse limite, até R$ 1.080,00 seriam para empréstimos tradicionais — 30% — e R$ 180,00 específicos para cartão consignado, se for o caso, observadas regras específicas).

Observações práticas para o DP

Classifique corretamente cada rubrica no ESocial (S-1200 / S-1210): se a rubrica for remuneratória e sujeita a INSS, ela integra a base; se for indenizatória ou reembolso sem natureza contributiva, deve ficar fora da base. Conferir a natureza na tabela de rubricas é essencial. 
  • Marcar claramente descontos voluntários no sistema de folha para que não sejam indevidamente subtraídos (a Portaria deixa isso explícito). 
  • Quando a remuneração disponível for menor que a parcela do consignado, o empregador poderá efetuar desconto parcial e deve informar o empregado sobre a dedução parcial (obrigação prevista na norma). 
  • Atenção a rubricas variáveis (comissões, horas extras): como elas alteram a base de contribuição, a margem pode variar mês a mês — o cálculo deve ser refeito a cada competência.


7. Conclusão

O crédito consignado é um exemplo clássico de como a combinação entre legislação, tecnologia e gestão trabalhista impacta diretamente a vida financeira de milhões de brasileiros.

Com a chegada do E-Consignado Trabalhador, o sistema tende a ganhar mais transparência e segurança, mas também exigirá maior competência técnica de empresas e profissionais de Departamento Pessoal.

Mais do que nunca, será necessário unir educação financeira para trabalhadores e precisão na gestão empresarial para que esse benefício não se transforme em armadilha.


Fontes de pesquisa:

Lei nº 10.820/2003
: Estabelece as condições para o desconto de parcelas de empréstimos em folha de pagamento para empregados regidos pela CLT.

Medida Provisória nº 1.292/2025: Altera a Lei nº 10.820/2003 para instituir o programa Crédito do Trabalhador, permitindo que trabalhadores celetistas solicitem crédito junto às instituições financeiras habilitadas.

Manual Operacional do Empregador – Crédito do Trabalhador: Orientações sobre a retenção das parcelas de empréstimo consignado e a escrituração correspondente no eSocial (S-1200 e S-1210).

Empréstimos consignados – FAQs – Banco Central do Brasil
: Esclarecimentos sobre o que é empréstimo consignado, margem consignável e cuidados a serem tomados antes de contratar.

Sobre o autor
SILVIA BATISTA Graduada em Ciências Contábeis - Especialista em Auditoria e Controladoria - Especialista em ESocial - Perita Trabalhista - Professora Universitária - Professora de cursos On Line - Conteudista

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